Bióloga Erika Hingst-Zaher aponta em podcast as principais espécies da capital, com destaque para as aves, e alerta quanto aos riscos para os animais e humanos
Sabiá-laranjeira: para evitar o barulho da cidade, ave agora começa a cantar de madrugada
Mais de 1.300 espécies de animais silvestres coexistem com os paulistanos e cumprem um papel importante na reconexão dos habitantes da maior cidade da América do Sul com a natureza, destaca a Dra. Erika Hingst-Zaher, zoóloga e pesquisadora do Instituto Butantan, em podcast produzido pelo Conselho Regional de Biologia (CRBio-01).
São Paulo abriga um total de 1.306 espécies de animais silvestres, dos quais 799 são vertebrados e 507 invertebrados, segundo o Inventário da Fauna Silvestre do Município de São Paulo, publicado pela Prefeitura em 2021. Predominam na cidade as aves (497 espécies) e insetos (426), seguidos pelos mamíferos (108), anfíbios (90), peixes (52), répteis (52), moluscos (43), aranhas (33), lacraias (3) e crustáceos (2).
Erika Hingst-Zaher destaca a variedade e beleza da avifauna silvestre: “As aves são particularmente importantes, porque são mais fáceis de se ver nas cidades do que, por exemplo, os mamíferos. Elas proporcionam serviços ambientais, como a polinização e a dispersão de sementes. Mas o aspecto utilitário deveria empalidecer diante da questão da beleza. Há uma relação direta entre bem-estar humano e natureza”.
Uma das espécies mais comuns em São Paulo é o sabiá-laranjeira, muito apreciado pela beleza do seu canto, que é ouvido cada vez mais cedo na capital. Essas aves cantam, dentre outros motivos, para encontrar parceiros para a reprodução. O canto originalmente começava ao amanhecer, mas o horário foi antecipado para 3h ou 4h da manhã para evitar a competição em volume com o ruído de veículos e a movimentação matinal na cidade, explica Erika Hingst-Zaher.
Os paulistanos podem observar e ouvir as aves principalmente nos parques, praças e cerca de 650 mil árvores nas ruas no município. Para aqueles que desejam apreciar as aves mais de perto, a Bióloga sugere estratégias para atraí-las. Quem tem quintal pode montar um comedouro: uma bandeja colocada no alto, fora do alcance de gatos e cachorros, com banana, mamão ou sementes. Na varanda ou janela, o morador pode posicionar um bebedor para beija-flor com água açucarada e florezinhas de plástico.
“Essa é uma forma fácil de se conectar com a natureza à sua volta e exercitar a sua atenção e curiosidade, mesmo em uma cidade grande. As aves vão aparecer”, garante Erika Hingst-Zaher. “Será que você consegue identificar todas as espécies? Há plataformas na internet, como o wikiaves.com.br, que podem te ajudar a descobrir mais. Na minha experiência, uma vez que as pessoas percebem os outros seres vivos que as rodeiam, começam também a se preocupar com a preservação da natureza em diversas escalas”.
Entre os mamíferos, aponta a Bióloga, uma das espécies nativas mais comuns em São Paulo é o gambá-de-orelha-preta, marsupial com focinho pontudo que pode ser visto no chão, árvores e cabos de fios elétricos. Assim como o canguru, que é seu parente, a fêmea dos gambás carrega seus filhotes na bolsa que tem na sua barriga ou os levam nas costas, quando já estão maiores. Gambás se alimentam de frutos e animais invertebrados e pequenos vertebrados, além de restos de comida que encontram no lixo.
Outro mamífero frequentemente visto nas árvores e fios de eletricidade da capital é o sagui. A espécie mais comum em São Paulo não é nativa, mas sim um híbrido entre o sagui-de-tufo-branco (também chamado de mico-estrela), originário do Nordeste, e o sagui-de-tufo-preto, do Cerrado. Eles chegaram à cidade por meio do tráfico de animais silvestres e causam certo desequilíbrio por serem predadores muito eficientes de ninhos de aves e outros vertebrados de pequeno porte.
São Paulo também abriga primatas de porte maior, como os macacos-pregos e os guaribas, que habitam as grandes áreas verdes da cidade, como o parque onde estão o Zoológico e Jardim Botânico e o do Horto Florestal, próximo à Cantareira.
Entre os répteis, os teiús e algumas cobras como a jararaquinha – que não é venenosa, apesar do nome – são bastante comuns em São Paulo. Os teiús passam o inverno hibernando e acordam no mês de setembro para se reproduzirem. Os morcegos, únicos mamíferos voadores, conseguem sobreviver bem nos ambientes urbanos devido à sua capacidade de voo. Eles cumprem uma função extremamente importante na polinização de plantas e dispersão de suas sementes e no controle de insetos. Das quase 200 espécies de morcegos que existem no Brasil, apenas três se alimentam de sangue. Quem mora em casa, recomenda a Bióloga, deve fechar todas as frestas e trocar telhas quebradas, de maneira a evitar que se formem colônias de morcegos nos sótãos
Riscos para os animais e humanos
Não se deve tocar ou interagir com nenhum animal silvestre, adverte Erika Hingst-Zaher. As pessoas podem machucar os animais, que, por sua vez, podem nos morder ou nos transmitir doenças, caso dos morcegos, saguis e também das capivaras. Esses grandes roedores, que habitam pastagens próximas a rios e lagos, por vezes carregam carrapatos, que potencialmente podem contaminar humanos com uma doença chamada febre maculosa.
Além dos humanos, animais de estimação, os pets, cada vez mais numerosos nas cidades, também representam um risco para certas espécies da fauna urbana silvestre.
No Brasil, havia 149,6 milhões de animais de estimação no fim de 2021, um aumento de 3,7% com relação ao ano anterior, segundo o levantamento anual do Instituto Pet Brasil (IPB).
Os cachorros domésticos, por exemplo, são uma grande ameaça para os gambás em São Paulo e outros locais. Mas os principais predadores da fauna silvestre urbana são os gatos domésticos, uma das principais causas do declínio das populações de aves e mesmo da extinção de certas espécies em algumas cidades.
“Num ambiente tão difícil de se sobreviver como o urbano, a predação tem impacto grande. O hábito de alimentar gatos que vivem livres em áreas públicas, ou mesmo de deixar seu gato solto fora de casa, representa um risco enorme para as aves e ratinhos silvestres”, alerta a Bióloga.
Fonte: Dra. Erika Hingst-Zaher, bióloga, zoóloga e pesquisadora do Instituto Butantan